A ditadura da moda

Éramos três. O afamado técnico de som olhou para os pés do artista que vem nas revistas e perguntou-lhe:
- Onde é que compraste esses sapatos?
- Não são sapatos, são sapatilhas e já têm uns anos
O homem do som olhou para os meus pés e também gabou as ferraduras. Depois comentou qualquer coisa do género:
- Não percebo esta merda. Agora um gajo para se calçar ou anda com uma foleirada tipo feira ou tem de gastar mais de vinte contos.
E ali ficámos uns largos minutos a desancar o comércio pedonal. Ter um par de sapatilhas é hoje um luxo - Não vou entrar nesse debate contra os parolos lisboetas que acham que o resto do país está errado quando chama sapatilhas ao que os 'cosmopolitas' designam por 'ténis'. A sapatilha tornou-se um acessório de moda que não dispensa as cores mais estrambólicas e os tecidos ultra high tech. Agora um gajo que não quer passar por astronauta e que está farto de allstar e afins - já agora, alguém me explica como é que umas socas de pano e borracha feitas no terceiro mundo custam 50 euros? - vê-se fodido para arranjar o que calçar. A ditadura da moda chega a tudo o que é loja. Comprar calçado nos tempos que correm é quase tão difícil como arranjar estacionamento no Bairro Alto ao fim-de-semana.