Volto à triste história da seara de milho, dos potencialmente perigosos transgénicos e dos seguramente retardados activistas. Não para discordar destas infelizes declarações de Miguel Portas. Já muitos o fizeram - e bem! - e até o próprio já se retratou - e bem!
Volto a essa história porque ela é de facto muito mais que um fait-diver. Toca várias cordas, faz tanger muitas problemáticas, cruza as tortas linhas da política, da ética e do direito. Até a ciência é chamada ao barulho! E quando lhe perguntamos: "Como é? Os alimentos geneticamente modificados são perigosos para o ser humano?" A resposta é um tímido: "Não sei."
Volto, dizia, porque o assunto me fez discordar doutro homem com quem costumo partilhar opiniões. Refiro-me a Noam Chomsky. Num curioso diálogo com Michel Foucault, cada um na sua língua, ocorrido em 1971 e publicado na edição de Agosto do Le Monde Diplomatique, o linguista americano diz o seguinte: "A desobediência civil implica um desafio directo àquilo que o Estado pretende, a meu ver ilegitimamente, que seja a lei. (...) Executar uma acção que impeça que o Estado cometa crimes é em qualquer instância justo(...)".
Não! Errado! Se, numa democracia, as leis emanadas de uma assembleia do povo eleita por este, de um governo mandatado por sufrágio universal e até de um referendo por voto directo não têm legitimidade, o que as terá? Até ver, não há forma mais justa de decidir sobre o que é ou não permitido. Quem seria o juiz dos tais crimes que justificariam acções violentas, desobediências civis e por aí fora? A consciência de cada um?
Bem se vê que por aí não vamos muito longe. Como já comentei com alguém, isso seria aprovar que uma beata ultra-católica entrasse por um hospital ou maternidade adentro, disparasse para a sala de operações onde decorria um aborto, esmurrasse o médico que o praticava e prosseguisse para esbofetear a mulher que decidiu pela interrupção voluntária da sua gravidez, legal por referendo mas considerada pela beata um crime. Logo, justíssimo impedi-lo.
Há leis injustas, estúpidas e até, em algumas ordens jurídicas, criminosas. É um facto. Mas, se vivemos em democracia e num estado de direito, há que combatê-las nos locais e pelos meios apropriados. Não é espezinhando vegetais. Que lá por não saberem exprimir-se muito bem em sociedade não são propriamente agentes mudos do poder autista do Estado.
sábado, setembro 1
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