sábado, agosto 19

Muito bem.

Penso que não temos muito mais por onde nos esticar com a nossa conversa. Eu compreendo o que defendes e a tua perspectiva do problema. E penso que estamos em duas posições dificilmente conciliáveis. Eu não preciso de ganhar carinho pelo povo libanês ou por qualquer outro povo muçulmano. Conheci nos últimos anos alguns e na terra deles. Fui sempre não só bem tratado e recebido, como passei tardes inteiras à conversa sobre tudo e mais alguma coisa. São boas pessoas, interessantes e inteligentes. Nunca conheci um israelita, mas calculo que não o sejam menos. Mas não é desta gente que falo e sim de governos podres de tão corruptos e de grupos terroristas que se aproveitam disso mesmo. Não compreendo como pode isto ser em algum momento tolerável, quanto mais romântico, como por vezes parece ser entendido. O Estado de Israel aproveita-se demasiadas vezes deste tipo de situações e com eles ganha posições de força na opinião pública e no território propriamente dito. Lamento que assim o seja. Mas é um Estado legítimo, também este com governantes democraticamente eleitos (esse argumento que parece justificar tudo) e que tem o direito de lutar pelo que entende ser os seus interesses. E entendo isto sem sequer concordar com a maior parte das decisões que os seus governos têm tomado.

4 comentários:

Anónimo disse...

É curioso como os dois afirmam racionalmente o mesmo, mas as expressões que usam no discurso estabelecem a distância emocional a que se encontram.

Politicamente, é claro para ambos e para mim que houve um erro ao se decidir um Estado para Israel num espaço culturalmente hostil e através duma gincana de episódios marcados a sangue. É óbvio para ambos e para mim haver aproveitamento político dos Estados Unidos, de Israel, ao querer aumentar a sua influência no território, da Fatah, ao se querer afirmar como a única força unificadora da Palestina, do Hamas em provar que a via política é a via dos fracos e que a única via sempre foi a sua luta armada. É óbvio para ambos e para mim o sofrimento, a dor de gerações, a perda, a tristeza, a vigília e a esperança perdida.

Obviamente que este cenário, quanto personificado, gera emoções. E acho que é exactamente esse o elemento mais marcado no duelo israelo-palestiniano, bem como nesta discussão – a emoção. Carinho, elogio, cumprimento, infame, totalmente, completamente, todos adjectivos e advérbios decorrentes. É a emoção que hiperboliza e que impede qualquer tentativa de racionalizar devidamente o conflito.

O maior veículo da emoção são sem dúvida os media. Porque estes apelam cada vez mais à emoção. Enviamos e-mails a apelar à participação numa manif porque nos sentimos solidários com uma imagem, um testemunho de sofrimento. Insultamos os terroristas de igual forma, a segurar no peito imagens de atentados ou do silêncio na rua, e a insultar os terroristas. Basta escoinderem-nos uma parcela disto e estamos emocionalmente marcados.

E a emoção tende a criar incoerências – só assim se justifica um Bloco de Esquerda que se opõe à intervenção armada internacional, por acreditar que esta escalará ainda mais o conflito - enquanto apoiou e apoia a resistência armada do povo oprimido da Palestina contra Israel. Só assim se compreende um Governo Americano que vende as suas armas a Israel, enquanto tenta ajuda (?) num eventual processo de paz.

Ou seja, todos concordamos, mas a emoção separa-nos. Os media não visam a objectividade, mas cada vez mais induzir reacções emotivas. E a emoção não é coerente. Perceberam ou vamos ter que nos chatear?

Sergio disse...

Mais ou menos, meu caro caçador de baleias, mais ou menos. O facto de duas pessoas se conhecerem há muito como eu e o Isauro e de se estimarem não faz das suas discussões sempre emotivas. E nem sabe (acho eu) o que nos esforçamos para não partir para insultos pessoais gravíssimos, o nosso ambiente natural.

Neste caso eu tento evitar o habitual entendimento da criação do Estado de Israel como um erro porque essa premissa leva à fácil solução de tirar Israel de lá. Como se a região fosse pacífica no caso de Israel não existir. Como se os grupos terroristas não existissem. Como se Israel não tivesse legitimidade para defender as suas fronteiras, hoje internacionalmente reconhecidas. Concordemos ou não, elas estão lá e já morreu demasiada gente a defender umas e outras para pensarmos em soluções que possam desrespeitar estas memórias. Ou entendemos a nossa vida regulada por um mínimo de Direito (que internacionalmente é já um pouco uma piada) ou não somos melhores que ninguém.

Nenhum Estado até hoje foi criado inocuamente. É sempre contra alguém. Só há Nação se existir o Outro, e havendo Outro há merda, olha a novidade.

Além do que artficial por artificial temos toda a África, já o Isauro puxou, bem, o assunto. E nesse caso manda-se embora quem?

Sergio disse...

No entanto, estou-lhe grato pelo simpático "vá, não se zanguem". Mas não é caso para tanto. Gostamos há muito de promover a discórdia, tanto melhor se for por questões realmente importantes. Abraço.

Anónimo disse...

Os Estados criados através de interesses políticos e não de verdadeiras e únivocas expressões culturais serão sempre artificiais? Possivelmente e até provavelmente, mas será demasiado inocente pensar hoje em dia noutra forma de génese estatal.

Mas o que nos / me indigna não é tanto a fraqueza do Direito Internacional, mas os cadáveres tombados, a memória dos que estão e estiveram, como refere, e a forma como lhes devemos a solidariedade que faz de nós humanos. Quer de um lado, quer do outro - daí dizer que só emocionalmente podemos tomar um partido e que esta não é uma questão racionalizável, pelo menos ao ponto estrutural que tentaram.

De resto, vejo em África bons e maus exemplos e também eu pouco acredito numa solução a médio prazo para este conflito. E essa é uma tragédia para testemunharmos diariamente e afavelmente discutirmos em pequenos fóruns como estes.