Eu sou um daqueles cinco milhões de portugueses que gostava de escrever um livro. É verdade, assumo aqui publicamente que um dia gostava de ver uma resma de folhas cosidas com o meu nome na capa. Mas aguardo serenamente que a providência me ponha à disposição uma boa história para contar. Nesse aspecto sou paciente - não me importo de esperar 50 anos se for preciso.
Mas há outra dificuldade nisto de querer entrar no mundo das letras. É que nasci no país errado. Estive ontem numa livraria e confirmei o que já suspeitava. Não há gato pingado que não tenha um romance na banca, ou, pelo menos uma compilação de crónicas de imprensa para apresentar. Jornalistas, gajos que aparecem na televisão, políticos, candidatos a ser qualquer coisa na vida, todos têm capa de design cuidado e fotografia a preto e branco na contracapa.
E, claro, há sempre o prefácio. Lemos invariavelmente que está tudo muito bem escrito, que o "jovem autor" é sempre uma revelação, que a história "aborda os problemas da nossa sociedade sem deixar de lado temas incómodos como a droga e o sexo". Enfim, loas de amigalhaços a quem se paga umas massas para mentir.
Gostava que houvesse honestidade nestas coisas. Que o prefácio fosse isento, com frases do género : "a ideia não era má mas está mal escrito", ou a "a ideia inicial era uma merda mas a escrita consegue piorá-la", ou mesmo, cúmulo da honestidade, "a cara do gajo vem na TV e é o único argumento que temos para apresentar isto encadernado". É que, no meio de tanto lodo, há-de haver quem escreva bem. Mas passa despercebido nesta fogueira de vaidades iliterárias.
O meu livro pode esperar. E até pode não vir. A continência é quase sempre boa atitude.
segunda-feira, março 14
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