quinta-feira, abril 28
Regicídio
Já não é de agora que acordo e faço a minha representação de morto-vivo durante os vinte, trinta minutos antes de sair de casa a ver aquele programa de notícias da RTP, cujo nome pode perfeitamente já ter mudado, mas que é possível que ainda se chame Bom Dia Portugal (os meus parabéns à pessoa que escolheu este nome e ao seu superior). São várias as vantagens mas lembro-me sempre de três. As notícias voltam ao princípio de quatro em quatro minutos, estou certo que no sentido de haver uma melhor assimilação dos conteúdos, a uma hora que não é fácil para ninguém. Vê-se as capas dos jornais, para mim serviço público do bom desde que deixei de passar por qualquer banca de jornais antes de ir para o trabalho. E, por fim, quando finalmente acordo (onze, onze e meia), nunca sei bem que notícias ouvi realmente e com quais sonhei, o que torna muito mais empolgante ir ler jornais depois de desperto. Não tinha planos de ter uma introdução tão longa, até porque não vim aqui falar bem da RTP, antes pelo contrário. Hoje ouvi no dito programa que, a partir de agora, há nova legislação que regula a Comercialização do Bacalhau e espécies afins, salgados verdes e secos. Aconselho a leitura, pelo menos, da nota de imprensa do ministério, onde se fica a saber que o bacalhau da Gronelândia é bacalhau mas o bacalhau do Ártico é uma espécie afim. Continuo é a disparatar, vamos lá ao essencial. Resumindo e, provavelmente até, aldrabando um pouco a lei (lá atrás disse que estava a disparatar mas é mesmo verdade que o bacalhau da Gronelândia é bacalhau e o bacalhau do Ártico é espécie afim), posso dizer que o bacalhau seco e semi-seco cortado deve estar acondicionado a 7ºC, sendo que só o inteiro seco e salgado pode estar à temperatura ambiente. Acrescento ainda que línguas, badanas, bochechas têm que estar obrigatoriamente embaladas. Pá, por mim, baril, até aqui tudo bem. A RTP (que ainda assim conseguiu não fazer disto um circo tão grande como eu já estou a fazer) tendo que fazer uma peça na rua decide ir onde? À Rua da Arsenal. Tau! É que já imagino o infeliz que propôs esta reportagem a esfregar as mãos com a grande ideia que teve. De génio, realmente. Achei desonesto, com um raio. São casas que nos merecem respeito reverencial, que toda a gente sabe onde ficam, assistiram a mudanças de regime violentas, algumas já lá estão ainda não havia eléctricos. Já basta um cheiro de mudar de passeio, não precisavam disto no primeiro dia da entrada em vigor da lei. De qualquer modo, parece que estavam preparados. Nem línguas, nem bochechas, nem badanas, nem mesmo caras que «podem ser comercializadas não pré embaladas, desde que seja assegurado que o consumidor não manuseia o produto». Havia isso sim, atum demolhado e salgado, e linguas, bochechas, badanas de atum à temperatura ambiente. Mas bacalhau, só inteiro, pendurado, com classe. E o senhor da loja até bastante pouco chateado com a coisa. "Tenho que pôr aqui uma vitrine em vez desta banca de mármore" e assim, e parecia tudo bem. Sem dramas. Gente do peixe seco e demolhado é gente serena, pareceu-me.
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